Opinião
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Estado de Emergência - Cidadania em Estado de Alerta

Importa afastar de vez a ideia que se generalizou na sociedade portuguesa de buscar os serviços do Advogado como interveniente de último recurso e quando se atingiu já o ponto de não retorno.

Fleed

  • Vitor Nunes Pinto
auto auto

 

Dizer que vivemos um tempo particularmente difícil é já um lugar-comum nos dias que correm. Sem que tenhamos percebido bem como, instalou-se-nos um vírus no quotidiano pessoal, familiar, local, nacional e internacional, que afetou todas as dimensões da nossa Vida.

Repentinamente, fomos “convidados” a recolhimento, distanciamento e isolamento social, palavras que, no nosso afanado e frenético dia-a-dia ante-Covid-19, dificilmente circulavam pelo nosso vocabulário…

O mundo, o nosso mundo afunilou e tornou-se mono temático…

A todo o instante, passamos a ser inundados por notícias, muitas notícias sobre o novo coronavírus. E a falar em números, muitos números sobre os confirmados, os recuperados, os suspeitos, os óbitos, o histórico dos outros países. E, claro, sobre os sinais e sintomas da doença, o período de contágio, a sua incidência na camada populacional, os grupos de risco, as causas, as teses, as teorias da conspiração, et coetera, et coetera. 

Num ápice, submergimos no discurso de dezenas, centenas de pessoas de diferentes áreas do conhecimento: uns pronunciando-se sobre a doença – os cientistas, epidemiologistas, virologistas, imunologistas, investigadores, médicos, enfermeiros… - outros sobre as consequências dela – dos políticos aos economistas, a sociólogos, psicólogos, psiquiatras, empresários, advogados, jornalistas, escritores... - sem esquecer os “opinion makers” que por aí grassam no terreno do “acho que”, sempre a opinar sobre tudo ou quase tudo, a tergiversar sem a menor base científica, a tentar arranjar o que dizer…

Pois bem, não há ambiente mais propício a ver afirmado “tudo e o seu contrário” do que aquele que estamos a viver (o que, nalguns casos, até tem dado para rir!). 

E mudaram-nos as regras, muitas regras do nosso viver coletivo.

Só a título de curiosidade: desde que decretado o estado de emergência pelo Chefe de Estado a 18 de março, foram publicados em Diário da República mais de 120 diplomas (!), por entre Decretos do Presidente da República, Leis da Assembleia da República, Decretos-Lei do Governo, Resoluções do Conselho de Ministros e da Assembleia, Portarias, Despachos, Deliberações, Declarações de retificação… 

Uma autêntica desbunda legislativa! E falamos apenas de diplomas relacionados ou determinados pelo malandreco do vírus. É caso para dizer: não podia ser mais premonitório o anúncio em covid19estamoson.gov.pt: “NÃO PARAMOS”! – sic.

Desdobrem-se agora esses diplomas pelas muitas normas que cada um necessariamente comporta.

A juntar ao caldo, adicione-se a disseminação dos vários temas neles versados por todos os órgãos de comunicação social: da rádio à tv, imprensa escrita, internet e redes sociais, os múltiplos debates, fóruns e conferências a propósito… Ah! E não se olvidem as múltiplas interpretações das normas e da sua aplicação (sim, porque, por mais claro que seja o texto, sempre haverá quem queira ler para além do que lá está ou pura e simplesmente não está).

Last but not the least, o sistema judicial está praticamente paralisado, tanto quanto suspensos estão os prazos judiciais.

Mas há mais a agravar o cenário: desde os primeiros dias desta crise pandémica, que vemos, ouvimos e lemos sobre os vários cenários do pós-guerra, as previsões económicas mais negras, as quedas do PIB, do desemprego, do mal que vai assolar a nossa vida individual, familiar e coletiva, enfim, sobre a antecipação de um futuro que “só” pode ser negro e sombrio à escala global.

Do mal do vírus, passamos ao mal do… medo. Como se já não bastasse a maleita, o encerramento ou paragem de n atividades económicas, o lay-off para um milhão e a suspensão da vida social de todos, agora, e por efeito deste infindável set de ondas de informação (tão repetido quanto errático), instalou-se nas pessoas o medo e seus correligionários: a angústia, a insegurança, a instabilidade, a desconfiança, o distanciamento, a incerteza, o desnorte. Ora, daqui para a irracionalidade e precipitação dos nossos atos, é só um pequeno passo. 

A questão é que, há muito para pensar e para decidir, por exemplo, no domínio das relações empregado/entidade patronal, senhorio/inquilino, seguradora/segurado, credor/devedor, beneficiário/empregador/segurança social, contribuinte/autoridade tributária, comprador/vendedor, parte/contra parte nos contratos, o lay-off, os empréstimos e os Bancos, o futuro dos negócios e das empresas, emprego/desemprego, é o modo como este estado de coisas alterou os pressupostos na celebração dos contratos pendentes e na sua execução, enfim, são as relações Autor/Réu, MP/arguido e tantas, tantas outras.

Sobreposto o estado de emergência à imensidão de relações do comércio jurídico em que nos movemos (e não só, claro), há que parar e procurar ver em perspetiva o nosso pequeno mundo: o que tínhamos e temos e o tempo que há-de-vir.

O que fazer? Seguir o instinto? Agir por “ouvir dizer”? Basear as decisões em entrevistas, artigos de opinião, conferências públicas ou outras formas de comunicação escrita ou oral? Recorrer a um data center? Perguntar aos amigos ou conhecidos?

Ou, pelo contrário, assumir uma cidadania de pleno direito, procurando aconselhamento profissional avisado e competente?

O cidadão comum, repito, vive um ambiente de medo, de excecional fragilidade, desconfiança e incerteza quanto ao seu futuro: confrontado com novos quadros normativos e tendo de tomar decisões sobre os seus direitos e obrigações, deve evitar a precipitação, o juízo fácil e gratuito, as redes de informação, as colagens. Até porque, “cada caso é um caso”…

É de primordial importância para o cidadão – mais ainda no atual contexto – estar bem informado, conhecer bem as leis, as normas, os seus direitos e as suas obrigações. E depois, refletir bem no modo como as normas se aplicam ao seu problema, à sua situação de facto, avaliando bem as várias soluções que a lei consagra, as vantagens e desvantagens da opção por uma ou outra dessas soluções, para então sim, passar a uma tomada de decisão consciente e responsável.

Nessa tarefa, o Advogado pode revelar-se um aliado essencial: utilizando todos os recursos da sua formação, experiência, saber e atividade, o Advogado deve fomentar um verdadeiro trabalho de equipa e, claro está, sem prejuízo do cumprimento da lei, defender os interesses legítimos do seu cliente, formulando opinião conscienciosa e aconselhando toda a composição que julgue equitativa e mais adequada a esses interesses.

A esse “trabalho de equipa” gosto de chamar de “Advocacia Preventiva”, fundamentalmente vocacionada para a prestação de serviços extrajudiciais e que tanto tem por destinatários, pessoas singulares como coletivas.

A verdade é que, o tempo e os índices de litigância no nosso país, há muito trazem à evidência que a Advocacia de Prevenção, mais do que um custo – as mais das vezes, o da mera consulta, que, por si só tanto transtorno, “processo” e prejuízo irreparável podia evitar (se podia!) – constitui um importante investimento, melhor ainda, um verdadeiro seguro multi-riscos.

E no que não é de somenos, a Advocacia Preventiva comporta benefícios, v.g.:

- otimiza o fator tempo;

- acautela os riscos de uma decisão adversa dos Tribunais;

- minimiza custos, desde logo os de qualquer processo judicial;

- previne prejuízos; e

- evita o desgaste psicológico e a ansiedade que qualquer processo necessariamente acarreta.

Importa afastar de vez a ideia que se generalizou na sociedade portuguesa de buscar os serviços do Advogado como interveniente de último recurso e quando se atingiu já o ponto de não retorno. 

O advogado não é só um pleiteador, um litigante, um profissional do foro. Se consultado em devido tempo, pode mostrar-se um avisado conselheiro, alguém digno de confiança, por isso auxiliando - com atempado estudo, reflexão e segurança jurídica - ora na prevenção de problemas ou consequências jurídicas nefastas, ora na tomada das decisões mais ajustadas ao momento.

Por Lei, o Advogado é indispensável à administração da justiça e está obrigado, além do mais, a pugnar pela boa aplicação das leis e a colaborar no acesso ao Direito.

Por Lei, o exercício da consulta jurídica constitui ato próprio do Advogado. 

Do mesmo modo que a dor, ou o receio dela, leva o cidadão a um consultar um médico, aqui deixo um apelo ao exercício de uma cidadania de banda larga: antes da prática de qualquer ato ou tomada de decisão que o possa afetar, procure o conselho de um profissional qualificado.

Consulte um Advogado. 

Sabia que, ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas? A Lei assim reza.

No tempo que vivemos, não há margem para a incompetência. Mais: como bem se obtemperou na imprensa escrita por estes dias, “a incompetência mata”.

Por isso, além da imunidade que ansiamos atingir para combater o vírus, bom é que procuremos a “imunidade” indispensável para combater os nossos problemas e cuidar dos nossos interesses como deve ser.

A vacina dos Tribunais vai demorar… e as coisas não vão voltar ao que eram.

*Advogado

 

Dizer que vivemos um tempo particularmente difícil é já um lugar-comum nos dias que correm. Sem que tenhamos percebido bem como, instalou-se-nos um vírus no quotidiano pessoal, familiar, local, nacional e internacional, que afetou todas as dimensões da nossa Vida.

Repentinamente, fomos “convidados” a recolhimento, distanciamento e isolamento social, palavras que, no nosso afanado e frenético dia-a-dia ante-Covid-19, dificilmente circulavam pelo nosso vocabulário…

O mundo, o nosso mundo afunilou e tornou-se mono temático…

A todo o instante, passamos a ser inundados por notícias, muitas notícias sobre o novo coronavírus. E a falar em números, muitos números sobre os confirmados, os recuperados, os suspeitos, os óbitos, o histórico dos outros países. E, claro, sobre os sinais e sintomas da doença, o período de contágio, a sua incidência na camada populacional, os grupos de risco, as causas, as teses, as teorias da conspiração, et coetera, et coetera. 

Num ápice, submergimos no discurso de dezenas, centenas de pessoas de diferentes áreas do conhecimento: uns pronunciando-se sobre a doença – os cientistas, epidemiologistas, virologistas, imunologistas, investigadores, médicos, enfermeiros… - outros sobre as consequências dela – dos políticos aos economistas, a sociólogos, psicólogos, psiquiatras, empresários, advogados, jornalistas, escritores... - sem esquecer os “opinion makers” que por aí grassam no terreno do “acho que”, sempre a opinar sobre tudo ou quase tudo, a tergiversar sem a menor base científica, a tentar arranjar o que dizer…

Pois bem, não há ambiente mais propício a ver afirmado “tudo e o seu contrário” do que aquele que estamos a viver (o que, nalguns casos, até tem dado para rir!). 

E mudaram-nos as regras, muitas regras do nosso viver coletivo.

Só a título de curiosidade: desde que decretado o estado de emergência pelo Chefe de Estado a 18 de março, foram publicados em Diário da República mais de 120 diplomas (!), por entre Decretos do Presidente da República, Leis da Assembleia da República, Decretos-Lei do Governo, Resoluções do Conselho de Ministros e da Assembleia, Portarias, Despachos, Deliberações, Declarações de retificação… 

Uma autêntica desbunda legislativa! E falamos apenas de diplomas relacionados ou determinados pelo malandreco do vírus. É caso para dizer: não podia ser mais premonitório o anúncio em covid19estamoson.gov.pt: “NÃO PARAMOS”! – sic.

Desdobrem-se agora esses diplomas pelas muitas normas que cada um necessariamente comporta.

A juntar ao caldo, adicione-se a disseminação dos vários temas neles versados por todos os órgãos de comunicação social: da rádio à tv, imprensa escrita, internet e redes sociais, os múltiplos debates, fóruns e conferências a propósito… Ah! E não se olvidem as múltiplas interpretações das normas e da sua aplicação (sim, porque, por mais claro que seja o texto, sempre haverá quem queira ler para além do que lá está ou pura e simplesmente não está).

Last but not the least, o sistema judicial está praticamente paralisado, tanto quanto suspensos estão os prazos judiciais.

Mas há mais a agravar o cenário: desde os primeiros dias desta crise pandémica, que vemos, ouvimos e lemos sobre os vários cenários do pós-guerra, as previsões económicas mais negras, as quedas do PIB, do desemprego, do mal que vai assolar a nossa vida individual, familiar e coletiva, enfim, sobre a antecipação de um futuro que “só” pode ser negro e sombrio à escala global.

Do mal do vírus, passamos ao mal do… medo. Como se já não bastasse a maleita, o encerramento ou paragem de n atividades económicas, o lay-off para um milhão e a suspensão da vida social de todos, agora, e por efeito deste infindável set de ondas de informação (tão repetido quanto errático), instalou-se nas pessoas o medo e seus correligionários: a angústia, a insegurança, a instabilidade, a desconfiança, o distanciamento, a incerteza, o desnorte. Ora, daqui para a irracionalidade e precipitação dos nossos atos, é só um pequeno passo. 

A questão é que, há muito para pensar e para decidir, por exemplo, no domínio das relações empregado/entidade patronal, senhorio/inquilino, seguradora/segurado, credor/devedor, beneficiário/empregador/segurança social, contribuinte/autoridade tributária, comprador/vendedor, parte/contra parte nos contratos, o lay-off, os empréstimos e os Bancos, o futuro dos negócios e das empresas, emprego/desemprego, é o modo como este estado de coisas alterou os pressupostos na celebração dos contratos pendentes e na sua execução, enfim, são as relações Autor/Réu, MP/arguido e tantas, tantas outras.

Sobreposto o estado de emergência à imensidão de relações do comércio jurídico em que nos movemos (e não só, claro), há que parar e procurar ver em perspetiva o nosso pequeno mundo: o que tínhamos e temos e o tempo que há-de-vir.

O que fazer? Seguir o instinto? Agir por “ouvir dizer”? Basear as decisões em entrevistas, artigos de opinião, conferências públicas ou outras formas de comunicação escrita ou oral? Recorrer a um data center? Perguntar aos amigos ou conhecidos?

Ou, pelo contrário, assumir uma cidadania de pleno direito, procurando aconselhamento profissional avisado e competente?

O cidadão comum, repito, vive um ambiente de medo, de excecional fragilidade, desconfiança e incerteza quanto ao seu futuro: confrontado com novos quadros normativos e tendo de tomar decisões sobre os seus direitos e obrigações, deve evitar a precipitação, o juízo fácil e gratuito, as redes de informação, as colagens. Até porque, “cada caso é um caso”…

É de primordial importância para o cidadão – mais ainda no atual contexto – estar bem informado, conhecer bem as leis, as normas, os seus direitos e as suas obrigações. E depois, refletir bem no modo como as normas se aplicam ao seu problema, à sua situação de facto, avaliando bem as várias soluções que a lei consagra, as vantagens e desvantagens da opção por uma ou outra dessas soluções, para então sim, passar a uma tomada de decisão consciente e responsável.

Nessa tarefa, o Advogado pode revelar-se um aliado essencial: utilizando todos os recursos da sua formação, experiência, saber e atividade, o Advogado deve fomentar um verdadeiro trabalho de equipa e, claro está, sem prejuízo do cumprimento da lei, defender os interesses legítimos do seu cliente, formulando opinião conscienciosa e aconselhando toda a composição que julgue equitativa e mais adequada a esses interesses.

A esse “trabalho de equipa” gosto de chamar de “Advocacia Preventiva”, fundamentalmente vocacionada para a prestação de serviços extrajudiciais e que tanto tem por destinatários, pessoas singulares como coletivas.

A verdade é que, o tempo e os índices de litigância no nosso país, há muito trazem à evidência que a Advocacia de Prevenção, mais do que um custo – as mais das vezes, o da mera consulta, que, por si só tanto transtorno, “processo” e prejuízo irreparável podia evitar (se podia!) – constitui um importante investimento, melhor ainda, um verdadeiro seguro multi-riscos.

E no que não é de somenos, a Advocacia Preventiva comporta benefícios, v.g.:

- otimiza o fator tempo;

- acautela os riscos de uma decisão adversa dos Tribunais;

- minimiza custos, desde logo os de qualquer processo judicial;

- previne prejuízos; e

- evita o desgaste psicológico e a ansiedade que qualquer processo necessariamente acarreta.

Importa afastar de vez a ideia que se generalizou na sociedade portuguesa de buscar os serviços do Advogado como interveniente de último recurso e quando se atingiu já o ponto de não retorno. 

O advogado não é só um pleiteador, um litigante, um profissional do foro. Se consultado em devido tempo, pode mostrar-se um avisado conselheiro, alguém digno de confiança, por isso auxiliando - com atempado estudo, reflexão e segurança jurídica - ora na prevenção de problemas ou consequências jurídicas nefastas, ora na tomada das decisões mais ajustadas ao momento.

Por Lei, o Advogado é indispensável à administração da justiça e está obrigado, além do mais, a pugnar pela boa aplicação das leis e a colaborar no acesso ao Direito.

Por Lei, o exercício da consulta jurídica constitui ato próprio do Advogado. 

Do mesmo modo que a dor, ou o receio dela, leva o cidadão a um consultar um médico, aqui deixo um apelo ao exercício de uma cidadania de banda larga: antes da prática de qualquer ato ou tomada de decisão que o possa afetar, procure o conselho de um profissional qualificado.

Consulte um Advogado. 

Sabia que, ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas? A Lei assim reza.

No tempo que vivemos, não há margem para a incompetência. Mais: como bem se obtemperou na imprensa escrita por estes dias, “a incompetência mata”.

Por isso, além da imunidade que ansiamos atingir para combater o vírus, bom é que procuremos a “imunidade” indispensável para combater os nossos problemas e cuidar dos nossos interesses como deve ser.

A vacina dos Tribunais vai demorar… e as coisas não vão voltar ao que eram.

*Advogado

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